Quando a composição começou a andar, o silêncio que tomava conta do carro deu lugar a uma voz segura e decidida. A cidadã, então, começara a narrar uma parte da história de sua vida. Ela contou que havia chegado de Brasília, há cerca de três semanas, com seus dois filhos, um com dois anos e outro com oito.
- Eu pensava que iria conseguir rapidamente um emprego, mas até agora nada – desabafou a mulher.
Ela acrescentou, ainda, que sua criança mais nova era alérgica a lactose e, por isso, só podia tomar leite de soja, cuja lata custava cerca de 15 reais. O valor já é uma verdadeira exorbitância para qualquer trabalhador, imaginem, então, para uma dona-de-casa desempregada.
Após expor o seu caso, que era atentamente acompanhado por todos ali presentes, a moça falou:
- Já deixei meu currículo em várias empresas, porém, não posso ficar esperando que eles me telefonem. Tenho dois meninos para alimentar e não consigo chegar em casa de mãos abanando. Por favor, se alguém tiver qualquer serviço para eu fazer é só falar que eu vou agora com você! Pode ser uma faxina, uma roupa pra passar, um banheiro pra lavar. É só falar que eu vou agora!
Apesar de não ter pedido dinheiro, mas sim uma forma digna de ganhá-lo, um senhor logo puxou uma nota de 10 reais e deu para a mulher. Em seguida, diversos outros passageiros, comovidos com o relato, ofereceram cartões, com indicações de trabalho, dinheiro, e até pequenos lanches.
- Leva para o seu filho – falou uma senhora, entregando-lhe alguns pães de queijo.
A história dessa cidadã, que migrou da Região Centro-Oeste para uma grande metrópole, em busca de melhores condições de vida, é algo cada vez mais comum no país em que vivemos. Centenas de pessoas deixam suas origens, em diversas regiões do Brasil, em direção às regiões Sul e Sudeste, com o bolso vazio e o coração cheio de esperança.
A diferença no caso dessa desesperada dona-de-casa com outras pessoas, que também se encontram em dificuldades financeiras, está na atitude, fazendo-nos refletir. Ao mesmo tempo em que o governo se preocupa em oferecer auxílios, como o "Bolsa Família", ele se esquece completamente que o povo precisa mesmo é de oportunidades, de emprego, onde possa receber dignamente por seu próprio esforço.
Hoje, essa moça voltou para casa com alguns trocados a mais, contudo, o leite de amanhã de seus pequenos filhos, ainda é uma incerteza.
"A solidariedade é o sentimento que melhor expressa o respeito pela dignidade humana."
( Franz Kafka )